quem sou eu

28.4.11

O parto

Chegara a hora do parto. A futura mae nao sabia muito bem o que estava por vir. Havia lido sobre respiracao, contracoes, forca do ventre, escuta do coracao, concentracao, agachamento, posicao de cocoras, e mais uma porcao de informacoes para a preparacao na hora da vinda. A tao esperada hora. Quem disse que ouvir historias atenua o sofrimento do outro?

Cada ser com a sua experiencia. A mae da maebarriguda, havia dito que parto natural em casa era o melhor a se fazer e que ali, naquela mesma casa dera 'a luz a tres lindas criaturas saudaveis, inclusive a sua filha que horas depois 'aquelas tao sofridas, tornaria-se mae pela primeira vez. Conversa de mae, entretanto, vale a pena ouvir e concordar. Fez-se entao o contato com a primeira parteira, cujo pre-natal teria sido bem tranquilizante, nao fosse a sua partida 5 dias antes do bebe dar sinal de querer sair de dentro.

Fez-se entao o contato com a segunda parteira. Muito doce, muito traquila. Chegara na casa, no dia da luz, as dez da manha, de mala e cuia, tudo preparado, soro de emergencia, vidrinhos, seringas, luvas, gel, escutador de coracao de bebe. Esse era seu aparato mais importante, o colocava na barriga da mae e sabia o quanto ainda poderia esperar, o quanto o bebe resistia e vibrava naquele ciclo de contracoes doidas.

A dor foi aumentando. A dor tornou-se o centro das atencoes, quando a saida do bebe deveria ser o foco. Mas o foco nao depende somente do olhar. A dor fe-la enlouquecer. Berros, sussuros e berros. Havia panico nos gritos, havia medo, havia tristeza e muita dor, tudo misturado com o fato da propria inaptidao de nunca ter feito aquilo antes, da relutancia ao repetir a si mesma "Nao vou conseguir". Do meio-dia 'as cinco da tarde tudo parecia desespero. A parteira, sempre um doce. A Flor, amiga da garota barriguda ainda que em prantos silenciosos, fazia de tudo para encoraja-la. O futuro pai a amparava com seus ombros, seu colo, seu olhar tenro, sua voz mansa e carinhosa. A mae queria protejer a propria filha, mas comecou a ficar tensa, assim como a sogra que orava, de um lado para o outro, a todos os santos e astros para as bencaos dos ceus.

Tanta dor, meu pai do ceu.  A familia prometendo e cumprindo a ajuda envolta dela. Todos assistindo tudo sem entender ao certo, queriam ver o bebe vivo e o trabalho terminado. Seria melhor a todos. A gestante, no entanto, entrou no seu redemoinho doloroso, e la ficou aninhada por todas aquelas horas, um processo todo seu de sofrer, de deixar-se doer, de externalizar os gritos, de segurar e soltar suas tensoes, um revival de tudo que havia sido sua gravidez, um drama com final feliz, uma tragedia comica, uma possivel beleza na sua vida acrescida de incertezas.

O tempo chega pra cada qual. Nao foi diferente com ela. A parteira decidiu agir em prol de todos e sussurrando quando a mae da gestante saiu do quarto, encarou o desafio: "Voce segura aperna dela de ca, a Flor de la', o pai, empurra a barriga assim e, vo', segura as maos dela envolta dos pescoco do pai" e quando veio a contracao, ouviu-se alto e forte "Segura o grito menina, faz essa forca pra baixo, empurra" entao o bebe veio, de uma vez. Havia duas horas que se via o cabelo na porta da saida, mas, como o nome diz, um parto e' um parto!

Aprendiz de parteira e da vida: nao se pode adiar os fatos. Quanto mais demorado, mais dolorido fica. Deixa tudo ir, com a forca que e' preciso ter.

Nenhum comentário: