quem sou eu

4.10.08

Pela rua

Passei o dia em casa sentada na frente do piano (nao e' um piano de verdade, um teclado que faz parecer) e em cima dele estava o computador, e nas telas eu procurei as musicas que quero cantar, enquanto no piano brincava com os tons e semitons das notas sendo transpostas pela voz. Finalmente estou descobrindo as notas dentro da minha propria voz. Parece magica, parece magia. Fiquei horas, saltanto de uma musica pra outra, encontrando versos dentro da melodia.
O tempo mudou. Talvez tenha mudado a estacao com a vinda de um vento frio e incessante que carrega nuvens cheias e passantes. Eu desviava o olhar do piano para a janela e via as folhas de uma parreira em cima do muro dancarem uma danca sem fim, movimentos continuos e aleatorios. No fim da tarde decidi ir a padaria e caminhando pela rua senti a garoa fina no cabelo e no nariz. Me lembrei que estou num outro pais, vivendo uma vida nova cheia de lembrancas da vida no meu pais, na minha casa, com os meus amigos querendo me ligar a qualquer hora, fazendo alguma visita deliciosa, buscando inventar algum passeio, algum show instrumental gratuito, comer uma pizza na pizzaria barata onde o garcon te trata bem. Sempre a lembranca de qualquer situacao imprevista,dos elogios e agradecimentos por ter o amigo por perto. Mas andando sozinha na rua, lembrei-me da sensacao de estar em outro pais, onde as situacoes tambem sao imprevistas porque voce sabe que aquele amigo nao esta' la' pra te ligar, nem vai encontrar sua mae de touca de banho cozinhando os legumes, esperando o tempo da tintura do cabelo. A sensasao nao e' essa, e' outra, e' tambem meio poetica porque o frio naturalmente traz instrospeccao, maos guardadas nos bolsos dos casacos longos e acolchoados. Parece que voce esta' sempre precisando proteger-se, aninhar-se num casulo quentinho, buscar calor dentro de voce mesmo e na sua casa que nao e' tao sua ainda, porque e' nova, mas que ja contem sua energia.
Em pleno sabado a noite, eu nao tenho a euforia no peito de saber que vai ter festa e eu vou sair pra dancar com meus amigos preferidos, nem vou comemorar o aniversario da mulher que eu mais admiro na vida, ela esta' longe, trabalhando pra poder vir pro outro pais e conhecer a sensacao de que tanto lhe falo. Se eu tivesse um cigarro, fumaria enquanto caminhava, e em casa tambem fumaria na frente da chamine' com uma xicara de cha.
O frio esta' trazendo calma e quietude. A mente comeca a perceber que o tempo vai passar mais devagar e isso vai ser bom pra nao ver a vida passar tao rapido, como acontece na maioria das vezes. Talvez seja tempo de compor, de descobrir pequenas coisas, de inventar historias e de sentir o coracao bater. E de escutar mais uma vez o que Chico gosta de dizer.

"Eu vejo aquele rio a deslizar
O tempo a atravessar meu vilarejo
E às vezes largo O afazer
Me pego em sonho A navegar
Com o nome Paciência
Vai a minha embarcação
Pendulando como o tempo
E tendo igual destinação
Pra quem anda na barcaça
Tudo, tudo passa Só o tempo não"

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