quem sou eu

24.5.09

Louvores

"a sala está cheia, minha gente,
como é que eu entro agora?

eu entro minha gente, eu entro
com deus e nossa senhora"

Assim aquela senhorinha, de um metro e meio de altura, cabelo preso num pequeno rabo de cavalo, pulseiras de bolinhas coloridas e poucos colares, saia de renda amarela e camisa bordada à mão, com as mãos elevadas ao céu, os olhos voltados para a sala repleta de ouvintes, com q voz firme no microfone, ela pronunciou esses versos lindamente e deu inicio à cantoria feita por mais de dez mulheres no palco. Era um show especial, uma homenagem ao Divino com a tradição das caixeiras do divino do Maranhão.

As maranhenses que estavam no palco eram lindas. Mulheres fortes, simples, umas tímidas outras sorridentes e alegres, todas com um brilho especial no olhar, com uma ternura enquanto cantavam, vozes potentes, agudas, cantoria de fé. Os canticos eram como louvores ao Espírito Santo, à estrela guia, aos mastros que conservam os pedidos, as devoções, as promessas. Foram dias de procissão, adoração, homenagem, saias brancas, giro de saias, toque das caixas.

Parece que uma vida se passou em duas semanas e meia de celebração. A cada dia de encontro, outra vela acesa, outro lenço estendido na mesa, a imagem do pombo branco que voa pela paz, voa paz, avoa em paz. Tocar sentada com aquela caixa no colo ao lado de mulheres e à frente de outras mulheres é como um mantra que nos cobre com um manto suave, que aquece o ventre e dá o aconchego do calor materno, da pureza de sentimentos, de beleza de desejar coisas boas e ter uma luz amarelada por dentro, mesmo com os olhos cerrados.

Nesse ritual não tocam os homens. Não se pode tocar de calça comprida. Ninguém ousa atravessar o corredor de duas fileiras de caixeiras. A força das vozes femininas e a lentidão das mesmas se emaranham e se dissolvem na melodia serena. O mais bonito de tudo isso é que elas fazem por amor à vida, à vida desta terra, à vida terna, à vida eterna.

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