ao Moisés, que continua a escolher seu caminho
Todas as tardes aquele menino subia no muro como se conseguisse ficar mais próximo de Deus, sentindo a brisa tocar de leve seu rosto de menino que acabou de colher uma fruta madura do pé, que balançou na rede da varanda, que gosta de fechar os olhos e dormir no canto do quarto sozinho. Seus cílios fazem uma curva bonita e se enroscam uns nos outros quando ele pisca.
O menino caminha no muro com passos tranqüilos, mira os campos ao longe e nem se dá conta de que estou a olhá-lo em seu ir e vir no alto de concreto. Estar em cima do muro é observar os dois lados e não querer pular em nenhum deles, porque a partir do momento em que se pula, se perde a visão do alto, de ambas paisagens, do azul próximo do céu e da sensação de estar protegido pelo que está à sua volta. Ele sabe de tudo isso, e fica cada vez com mais medo de ter que sair dali.
Então todos os dias o menino quer refletir sobre o que tanto almeja e entristece; o que tanto angustia e devanece, o que acredita queimar no fogo e nadar no fundo do lago. O menino disse que não dá pra saber o que tanto queima e desaparece na fogueira em chamas, mas ele olha profundamente e, como se olhasse para seu coração, procura encontrar o que tanto arde e não cessa em arder neste tempo de fogo.
E como quando senta na beira do lago e se vê refletido nele, percebe que não é seu corpo que está dentro d´água, mas seus olhos de fora que enxergam através das profundezas de sua alma. Mergulhar na escuridão não é tão difícil quanto sair de cima do muro sem poder escolher uma estrela e guardá-la no seu bolso de menino.
Admiro o menino que às vezes parece esquecer que sua presença é tão serena que transmite paz, sabedoria e um brilho apertado nas pupilas. Ele ainda não se deu conta da sua grandeza apesar de ser ainda um menino magrinho que vai escalar muitos outros muros até finalmente escolher a terra batida pra pisar e criar seu caminho.
Nenhum comentário:
Postar um comentário