quem sou eu

2.12.10

Almirante

Lendo "O Poeta  é um fingidor", não esse livro exatamente, mas uma coletânea de poemas com comentários de uma pessoa que passou boa parte da vida lendo o Pessoa, reconhecendo seus museus, sabendo cada pedaço de vida do poeta amargurado, veio a pausa para observar; uma aparente infelicidade do Poeta fingidor se apoderava. Quem o sabe exatamente? Conviver com as palavras podia ser um caminho dos bem-acompanhados. O mundo lá fora pareceria pouco poético quando as palavras que um ser podia juntar eram todos os outros sonhos que se realizavam, outras imagens que se apresentavam, uma realidade que podia trazer algum sentimento novo, fora aquele que já se reconhecia no mundinho em que o poeta vivia. Ele vivia circundado de poucas pessoas, poucos poetas amantes de verdade.

Ao ler o poeta navegador, ele dizia - ou o personagem que nele existia, dizia: "Deito tudo para o chão, como tenho deitado a vida./ Mas ao menos fica da amargura do que nunca serei/ A caligrafia rápida desses versos/ Pórtico partido para o Impossivel (...)". Em poucas novas linhas, quem tem a cabeça incendiada de versos, logo faz a ponte do que está fora e o que ele, seu próprio ser enfrenta dentro. São momentos distintos entre bater de frente, face a face contra sua outra mesma face, de se xingar, de enrugar a testa, dá quase pra ouvir o tom de voz engrossando com desgosto de encher a boca com aquelas palavras proferidas pelo seu Eu, vindas do seu próprio espelho em fúria. São, enfim, momentos de ver o barco navegar e passar lentamente, com todas as estações que nele se carrega.

O Poeta acreditava ser sempre "o da mansarda" e talvez o fosse, não sei, hoje são muitos outros que traduzem suas palavras, são ensadecidos por elas, pelo que elas provocam, pela maneira como se configuram e mostram um pensamento, o Pessoa tinha um gênio que em si vivia e não se concebia, como tantos outros homens e por não crer em nada e  não ter certeza de nada, também se perguntava, "sou mais certo ou menos certo"? Hoje em dia e também antigamente, quem respondia à questão eram os pais das crianças, regrando tudo, colocando horários, notas, impostando sonhos. Ainda tem gente pagando imposto pra sonhar..."Mas-esta é  boa!- era de coração que eu falava...e onde diabo estou eu agora com almirante em vez de sensação?..."

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